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TÍTULOS ANTIGOS NO SITE DO TESOURO DIRETO

AÇÃO CIVIL COLETIVA: TÍTULOS ANTIGOS NO TESOURO DIRETO

         A declaração da imprescritibilidade dos empréstimos dos títulos de longo prazo oferecidos atualmente pelo TESOURO DIRETO é de fundamental importância, posto que daqui a 20, 30 40 ou mais anos, também serão “empréstimos antigos”.

         Empréstimos feitos a cidadãos que investiram nos títulos do Estado pensando na segurança da velhice ou futuro dos filhos e netos. O mesmo pensamento que animou os cidadãos investidores dos títulos “franco-ouro” ou do Reaparelhamento Econômico, no início e meados do Século 20.

        O Estado brasileiro quando contrai empréstimos com a promessa de amortizações e pagamentos de principal e juros com prazo de 20, 30, 50 ou mais anos, não o faz ao cidadão indivíduo, mas ao cidadão enquanto geração, que não falece e é perpétuo como o Estado.

        Empréstimos nestes prazos não são tomados a indivíduos, são tomados a gerações, são perpétuos, imprescritíveis.

       Eis algumas indagações que o site do TESOURO DIRETO não responde ao consumidor investidor:

  – Na hipótese de guerra, catástrofe, revoluções internas, “crash” internacional, qual o prazo de prescrição do direito de reclamar o crédito advindo atraso, deficiência ou inadimplência no pagamento por parte do Tesouro Nacional?

 – Como é a contagem do prazo para a cobrança judicial dos juros vencidos, da parcela não amortizada do capital e do capital integral?

 – Em caso de atraso, irregularidade ou moratória decretada pelo Estado brasileiro o crédito dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional pode ser utilizado em pagamento de tributos vencidos ou vincendos, transferidos a terceiros, dado em pagamento de dívidas junto ao sistema bancário, quitação de hipotecas, sub-rogação de dívidas, substituição de garantias, pagamento de fianças?

       A razão da AMARBRASIL formular Ação Civil Coletiva contra o TESOURO DIRETO para obter resposta a estas indagações decorre da resposta que a PGFN e a União Federal vem infligindo aos portadores dos títulos “franco-ouro”, quando solicitam o seu resgate.

        A história dos títulos “franco-ouro”” revela que o prazo de pagamento das amortizações, juros e principal foi prejudicado por duas guerras mundiais, pelo “crash” mundial de 1929, por duas “revoluções” internas no Brasil que somaram quase 40 anos de ditaduras de poderes e agentes historicamente antagônicos, algumas dezenas de moratórias unilaterais e “acordos” ilegais.

      O prazo que vem sendo adotado pela PFGN e União Federal é cinco anos, tanto para o resgate do principal quanto para juros e amortizações.

Prazo este criado por Getúlio Vargas no Decreto n. 20.910/1932, para impedir que o dinheiro das apólices nas mãos da República Velha exilada na Europa viesse a financiar levante contra a sua ditadura, o mesmo prazo do art. 60, da Lei 4.069/1962, adotado por João Goulart.

         Com exceção do período da ditadura Vargas, a memória histórica, doutrinária e legal havida desde o Brasil Império sempre foi pela imprescritibilidade do título público, posto que instrumento de captação da poupança popular.

         Isso se reflete nas palavras e na expressão de Rui Barbosa, também Ministro da Fazenda de 1889 a 1891, em um de seus grandes discursos pela moralidade e respeito pela coisa pública no Brasil:

 “Será igual, porventura, o valor circulante do crédito do Estado nessas duas manifestações diferentes: a apólice e a nota do Tesouro? A apólice é renda; a nota não é; a apólice pode ter amortização, a nota não se amortiza; a apólice gira fora do país, e tem cotação nas bolsas estrangeiras; a nota não corre senão no mercado nacional; a nota falsifica-se, perde-se anula-se, a apólice é inviolável e indestrutível; a nota não goza de privilégios; a apólice desfruta os maiores que a lei pode conferir à propriedade; a nota é um bem móvel, a apólice é equiparada aos haveres imobiliários, a apólice assenta na hipoteca dos bens dos Estado; a nota não tem senão a garantia abstrata de um compromisso indeterminadamente adiado. Como podereis sustentar, pois, que a nota pura e simples valerá tanto, quanto a nota apoiada na apólice? (Escritos e Discursos Seletos de Rui Barbosa – Ed. Nova Aguilar – Rio de Janeiro – 1995)

         O site do TESOURO DIRETO é um local de publicidade, captação e investimento da poupança popular. É um instrumento de popularização, democratização e incentivo do cidadão à poupança e ao investimento nos títulos do Tesouro Nacional.

        A ação para reclamar os créditos dos depósitos das poupanças populares é imprescritível (STJ, REsp. 710471/SC, 2004/0177281-3).

       Ora, não é nada razoável que o crédito da poupança do cidadão captada pelo sistema financeiro possa gozar de imprescritibilidade e a poupança do cidadão investida em títulos do Tesouro Nacional através do TESOURO DIRETO não goze do mesmo direito.

       A história e a posição demonstrada pelo Tesouro Nacional e PGFN, estão a sugerir que o pagamento dos títulos de longo prazo do TESOURO DIRETO, sobrevindo crise internacional, não terá destino diferente dos títulos “franco-ouro”, que o Tesouro denomina “francos franceses”.

      A publicação e informação passada sobre os títulos “francos franceses” em “Cartilha” de ampla circulação, é incompatível com o Estado Democrático de Direito e deve ser reprimida.

Também é incompatível com o Estado Democrático de Direito a insegurança e a ausência de declaração explícita do TESOURO NACIONAL quanto ao prazo de prescrição para cobrança dos créditos dos títulos emitidos em empréstimos tomados aos cidadãos brasileiros e estrangeiros através do TESOURO DIRETO, sobrevindo, guerras, crise internacional, atraso no pagamento dos juros e principal.

A Ação Civil Coletiva da Amarbrasil para a obtenção da declaração de imprescritibilidade dos títulos do TESOURO DIREITO, será julgada pelo  juiz Hamilton de Sá Dantas, da 21ª Vara da Justiça Federal de Brasília-DF.

Leia a petição inicial:

 

O Resgate dos Títulos Franco-Ouro

Para construção de portos e ferrovias no início do século XX o Brasil tomou dinheiro emprestado de cidadãos na Europa, oferecendo títulos ao portador com promessa de pagar principal e juros em ouro.
A questão é das mais curiosas e interessantes e foi aberta pela edição do Decreto Legislativo nº 20, de 1962 – ainda hoje não publicado no Diário Oficial da União (DOU).

Após a 1ª Guerra Mundial, o Brasil aceitou arbitragem da Corte Internacional de Haia que decidiu que o capital e juros desses títulos devem ser pagos pela correlação ouro, cada um Franco correspondente à “vigésima parte de uma peça de ouro pesando 6 gramas 45161, ao título 900/1000 de ouro fino”.

O pagamento dos títulos franco-ouro sempre foi prejudicado, seja por guerras mundiais, pela Revolução de 1930, pela morte de Getúlio Vargas ou por exceções institucionais.

Na parte que toca à Nova República, iniciada pela Revolução de 1930, o “Plano Aranha” cria “filtros” contra os detentores partidários da República Velha, fonte potencial de crédito para uma contrarrevolução.

Em 4 de maio de 1956, seguindo o “plano”, o embaixador brasileiro fez um “acordo por troca de notas” com o cônsul francês e a “Association Nacionale des Porteus Français de Valeurs Mobiliéres”, acertando e iniciando o pagamento dos títulos de 26 empréstimos franco-ouro emitidos pela União, Estados e municípios.

Ocorre que esses títulos também foram emitidos em Londres, Bruxelas, Genebra, Rio de Janeiro, Hamburgo, Amsterdam, praças de captação e pagamento e adquiridos por cidadãos de todo o mundo. Todos excluídos do “acordo”.

A jurisprudência sobre esses títulos teve por base conhecimento precário

Através do Decreto Legislativo nº 13 de 1959, publicado no DOU de 09 de outubro de 1959, o Congresso aprova o “acordo” e a oposição, em janeiro de 1960, apresenta o projeto de revogação denunciando diversos vícios.

Em 1962, dias antes da votação, o ministro Hermes Lima, nas Relações Exteriores, é convocado e explica ao Senado que o serviço de pagamento desses títulos “sempre foi atendido de forma irregular e deficiente” e que “a revogação (…) colocaria o governo em situação sui generis, pois já executou, em parte, o acordo. (…) Também teria o efeito de fazer com que títulos da União, Estados e municípios (..) voltassem a ser válidos para cobrança.”

O Congresso aprova a revogação e edita o Dec. Leg. nº 20 de 1962, publicado no DOU., de 18 de dezembro de 1962. O texto, ao contrário do votado, decreta em seu artigo 1º que “é aprovado o Dec. Legislativo nº 13, de 6 de outubro de 1959 que aprovou o Acordo de Resgate assinado no Rio de Janeiro, em 4 de maio de 1956″… O ato, assim publicado no DOU., correu mundo.

A informatização deu a conhecer que o texto aprovado e atualmente reproduzido, não é aquele do DOU, mas republicação havida no Diário do Congresso Nacional em 17 de janeiro de 1963. Neste sim, “é revogado” o Decreto Legislativo nº 13/59 que aprovou o “acordo de 1956”.

O golpe de 1964 e a ditadura militar soterraram memórias, responsabilidades e direitos.

No site do Tesouro Nacional não há referência aos títulos franco-ouro. O informe “Apólices emitidas em francos franceses – Acordo Brasil-França” é resumo do Parecer PGFN/COF nº 1652 de 1992, sobre consulta do Banco Central em atenção ao Banco do Brasil, em Portugal, que recebera de cidadão europeu pedido de resgate de um título franco-ouro.

O Parecer sonega ao cidadão o conhecimento de que o título estava na relação do “acordo” revogado. Admissível em 1992 que também a PGFN desconhecesse o texto do Decreto nº 20/62, republicado no D.C.N. O mesmo não podendo ser dito quanto à opinião da PGR, que desde 1948 já se punha contra a constitucionalidade dos “acordos” de 1941 e 1946, identicamente “por troca de notas”.

as decisões vistas o mais próximo do tema é o da apelação 1135290, julgada em 2008 pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª região, que reformou decisão de primeiro grau que reconhecera válido título franco-ouro da Estrada de Ferro Vitória-Minas. Do teor do acórdão, entretanto, vê-se que o TRF também não teve ciência do Dec. Leg. nº 20/62 que também revogou o “acordo de 1951”, que era questão nuclear da causa, igualmente havido por “por troca de notas”, do qual o “acordo de 1956” era extensão.

O pleno exercício e a consolidação do estado brasileiro como democrático e de direito atualmente vivido, a internet e o conhecimento livre, a obtenção de documentos sobre atos estatais destinados a viciar a vontade, iludir e lesar gerações de cidadãos proporcionam novas bases de postulação e em um Judiciário que se reengendra, também para novas respostas.

Respostas que no caso dos títulos franco-ouro poderão ser também concorrentes com os tribunais de Londres, Amsterdam, Hamburgo, Genebra e Bruxelas. Também o Tribunal Federal da Flórida, já que recentemente decidiu pela sua competência para apreciar pedido de resgate de títulos alemães, emitidos na década de 1920.

 

Uarian Ferreira é titular do escritório Uarian Ferreira Advogados SS; pós-graduado em gestão de empresa; estudioso do resgate e uso de títulos antigos da dívida brasileira.

Fonte: Valor Econômico.