Fim do segredo de justiça na investigação de paternidade

Quebra do segredo de justiça nas investigações de paternidade por exame de DNA e o Processo Judicial Eletrônico.

O número de 10,5 milhões de eleitores sem identificação do pai informado à AMARBRASIL pelo TSE1 levou a entidade a defender proposta2 pela federalização da investigação de paternidade e criação de um cadastro nacional de identificação por exame de DNA de material coletado após a morte do cidadão, do ser humano, em território brasileiro.

Em aprofundamento ao tema e em favor dos objetivos a serem ultimados com estas propostas deve ser levantado também o questionamento à constitucionalidade do sigilo ou “segredo de justiça” nos processos de investigação de paternidade por exame de DNA e/ou paternidade afetiva.

Todos quantos operam ou já operaram em processos desta natureza não tem receio de dizer que, na maioria dos casos, o segredo imposto aos atos do processo está a proteger a intimidade da irresponsabilidade, da indignidade, da psicopatia social e patrimonial, não da criança, da cidadania ou da família.

O sigilo em tais casos tem origem na Lei 883 de 1949, que impedia o registro de filho fora do casamento, mas, em segredo de justiça, autorizava a ação de prestação de alimentos. A lei foi revogada em 2009, mas o novo CPC, no item II, do art. 189, manteve a obrigação do sigilo.

A identificação da origem biológica ou determinação da paternidade afetiva da criança ou do cidadão é interesse e ação de Estado, afeto à formação da raiz da sociedade e do Estado Brasileiro, de resgate da dignidade humana, de fundamento e construção da sociedade livre, justa e solidária prevista nos artigos 1º, II, III e 3º, I da Constituição da República.

O concreto dos números do TSE e a informação de que entre 500 e 600 mil crianças, por ano, são registradas sem identificação paterna, por si só dão conta de que o sigilo processual nos casos de filiação deve ser “ordenado, disciplinado e interpretado, conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil” (Art. 1º do novo CPC).

O segredo de justiça na investigação de paternidade deve ser exceção, e não regra geral, cabendo invocar, nas ações individuais, a declaração “incidenter tantum” de inconstitucionalidade parcial do item II, do art. 189, para excluir o sigilo como regra absoluta do processo.

Os motivos são os objetivos e os fundamentos determinados como base para a construção da sociedade brasileira, da nossa República, expostos nos artigos 1º, II, III e art. 3º, I da Constituição, e art. 1º do novo CPC.

Para a hipótese, tanto pesa o concreto do caso individual, quanto o coletivo de 17 a 20 milhões de brasileiros sem identificação paterna.

A norma constitucional de raiz e o concreto dos casos assim vistos, também deverão autorizar aos Juízes aplicar o Princípio da Conexão na investigação de paternidade no ambiente do processo judicial eletrônico (PJ-E).

Com o PJ-E e o Princípio da Conexão será possível a formulação de ações de investigações de buscas permanentes de identidade parental por DNA. Órgãos do Judiciário e da Advocacia poderão requerer e acessar cadastros de identificação genética por exame de DNA em todo o país e de todos os processos.

Vem aí uma revolução nos processos de investigação de paternidade no Brasil.

Uarian Ferreira

Advogado e Superintendente da AMARBRASIL

1.http://www.amarbrasil.org.br/wp-content/uploads/2016/04/o-TSE-respondeu.pdf

2.http://www.amarbrasil.org.br/2016/04/04/investigacao-de-paternidade-amarbrasil-busca-solucoes/

 

Investigação de paternidade: AMARBRASIL busca soluções

Cadastro Nacional de Identificação por exame de DNA pós-morte e a Federalização da investigação de paternidade

É na advocacia individual que a AMARBRASIL1 encontra os casos para a formulação de suas ações coletivas2. O caso do cidadão Cláudio Pablo Pinheiro Câmara3, 36 anos, dos quais 30 pelejando na justiça pelo conhecimento de sua origem biológica e/ou reconhecimento de paternidade afetiva é um desses.

O drama vivido por Pablo motivou pesquisa cujos dados iniciais revelam quadro gravíssimo de impedimento ao processo de resgate da dignidade de pelo menos outros 17 a 20 milhões de cidadãos brasileiros. Quadro de impedimento da efetividade e da construção da sociedade justa e solidária proposta como fundamento e objetivo da nossa República (Arts. 1º, III e 3º I, da CRFB).

Em 12 de maio de 2015 a AMARBRASIL perguntou ao TSE4 “qual o número de cidadãos cadastrados como eleitores em todo o Brasil” e “desse número total, quantos eleitores não tem a identificação do nome do pai, ou seja, tem apenas o nome da mãe na parte de identificação dos genitores”. No dia 26 o TSE respondeu5: – do total de 142.257.487 de eleitores, 10.518.682 não tinham o nome pai em suas identificações cadastrais, ou seja, 10,5 milhões de eleitores brasileiros não possuem identificação paterna, não tem reconhecidos pais afetivos e nem biológicos.

No Estado do Maranhão o quadro é de lesa humanidade, 21,83% dos cidadãos eleitores, não possuem a identificação do pai em seus dados cadastrais.

A cultura da resistência por anos e anos de recursos e incidentes nos processos investigatórios, administrativos ou judiciais, destruindo a oportunidade de reconhecimento da paternidade afetiva ou frustrando o conhecimento da origem biológica é ato dos mais perversos que se pode infligir ao cidadão brasileiro. É ato de lesão à mais profunda identidade do cidadão, da cidadania, da sociedade brasileira. É ato de lesa humanidade. De flagrante ofensa aos objetivos e fundamentos de efetividade da República Federativa do Brasil.

Em janeiro de 2015 a Rádio Câmara6, numa entrevista com a Prof. Ana Liési Thurler (UNB),  especialista no assunto, divulgou que a cada ano entre 500 e 600 mil crianças, recebem a certidão de nascimento com o “nome do pai em branco”, “são filhos apenas da mãe”, e que esse número fora obtido com o cruzamento de dados fornecidos por cartórios de registros civis e IBGE.

Em maio do mesmo ano o portal Direitos das Crianças e dos Adolescentes da Bahia7 veiculou notícia de que “de acordo com informações do IBGE, na pesquisa Estatísticas do Registro Civil (2011), 30% das crianças nascidas no Brasil ficam sem reconhecimento paterno. Isso significa que, das 2.809.052 crianças nascidas vivas por lugar de residência da mãe em 2011, mais de 800 mil não tiveram o nome do pai na certidão de nascimento.”

Ao par desta notícia, também em maio de 2015, a AMARBRASIL perguntou ao IBGE8 “qual o número de número de crianças registradas, total e de cada Estado da Federação, nos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, que não tem a identificação do nome do pai, ou seja, tem apenas o nome da mãe na parte destinada à identificação dos genitores na certidão de registro de nascimento?”.

O IBGE respondeu9 que “as estatísticas do registro civil não coletam a informação de nome do pai ou da mãe” e que “a única informação coletada a respeito do pai é o local de nascimento deste (Unidade da Federação ou país)”, “que seria um erro fazer alguma aproximação de ausência de registro do nome do pai a partir desses dados” e, também, que “não reconhece a estimativa” publicada no portal “direitosdascriancasba.gov.br”.

Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com base no Censo Escolar de 2011, apontavam 5,5 milhões de crianças brasileiras sem no nome do pai na certidão de nascimento. Foi o que noticiou a Revista Exame10, em agosto de 2013.

Seguramente, entre dez e dezoito por cento da população brasileira não possui identificação paterna nos registros civis, são filhos unicamente da mãe. Pedidos de informações sobre esse tema parece não ser bem entendido pelo IBGE, o que pode ser visto pelo conjunto das “interlocuções” da AMARBRASIL com o órgão.

A identificação da origem biológica ou determinação da paternidade afetiva do cidadão é interesse afeto à formação da raiz do Estado Brasileiro, de fundamento da sociedade livre, justa e solidária prevista nos artigos 1º e 3º da Constituição da República.

Nesse contexto, não deve ser dos Estados, nem da Justiça Comum, mas sim da União, das Defensorias Públicas Federais, do Ministério Público Federal e da Justiça Federal, a responsabilidade, os custos investigativos, a competência e jurisdição dos atos destinados à garantia, realização e consecução da identificação biológica e/ou reconhecimento da paternidade afetiva das crianças e cidadãos brasileiros.

– O cidadão morto, de quem é o corpo?

Em alguns países, declarada a morte encefálica do cidadão, o corpo é do Estado, que tem prioridade para avaliar e retirar órgãos, tecidos e ossos para transplantes. Só depois destes procedimentos é entregue à família.

Só com os números informados pelo TSE vê-se a necessidade de criar um cadastro nacional de identificação biológica por exame de DNA, através da coleta de material genético do corpo após a morte do cidadão. A urgência de se criar instrumento que dê efetividade ao conhecimento, à investigação da origem biológica paterna, ao resgate da dignidade de milhões de crianças e eleitores brasileiros, ao exercício de realização da sociedade solidária, propostas como objetivo e fundamento de construção da República Federativa do Brasil.

Com esta abordagem resumida a AMARBRASIL está convidando11 e dando início à formação de grupo voluntário interessado em estudar a ideia e a possibilidade de construção de Ação Civil Coletiva e/ou Projeto de Lei de Iniciativa Popular e/ou criação e Frente Parlamentar voltada para a defesa e/ou discussão da federalização dos atos e dos processos de investigação de paternidade afetiva e biológica, bem como a criação de um banco de dados ou cadastro nacional de identificação genética por exame de DNA, de material biológico coletado dos cidadãos falecidos em território brasileiro, e brasileiros no estrangeiro, banco este mantido e gerenciado pela União Federal.

Com este cadastro nacional, matematicamente, em 25 anos de coleta, o número de brasileiros sem identificação paterna no registro civil cai para zero ponto. Por certo, Pablo Câmara, aos 25/30 anos, se existisse em tal tempo um cadastro desta natureza do Brasil, já teria obtido do Estado resposta e prova de sua origem biológica paterna; e por aí muito mais humanidade.

1. http://www.amarbrasil.org.br/about/

2. Ações coletiva

a) http://jus.com.br/peticoes/16527/acao-popular-contra-universidade-por-suposta-fraude-na-aquisicao-de-imovel-por-comodato
b) http://www.amarbrasil.org.br/wp-content/uploads/2014/11/jornalamarbrasil.pdf
c) http://s.conjur.com.br/dl/determinacao-conselho-nacional-justica.pdf
d) http://www.conjur.com.br/2010-jan-02/cnj-limita-emprestimo-servidores-executivo-judiciario
f) http://www.conjur.com.br/2010-jul-15/resolucao-anvisa-expoe-demonstracao-poder-associacoes
g) http://www.valor.com.br/arquivo/862775/supremo-definira-limite-de-multas
h) http://www.conjur.com.br/2010-jul-07/maquina-estatal-usada-reprimir-aterrorizar-produtores
i) http://www.brasil247.com/pt/247/goias247/112516/Telefonia-m%C3%B3vel-no-Brasil-pirataria-sonega%C3%A7%C3%A3o-e-transoceanismo.htm
j) http://www.valor.com.br/legislacao/2723632/empresas-de-telefonia-movel-devem-guardar-dados-de-caixa-postal
l) http://www.amarbrasil.org.br/wp-content/uploads/2013/07/Doc-01-C%C3%B3pia-da-Peti%C3%A7%C3%A3o-Inicial-A%C3%A7%C3%A3o-Civil-Coletiva-AMARBRASIL-x-Telef%C3%B4nicas-SMP.pdf
m) http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=38301&sid=9
n) http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Acao/noticia/2015/03/como-funciona-o-mercado-de-envio-em-massa-de-sms-feito-sob-medida-para-atazanar-sua-vida.html
o) http://www.amarbrasil.org.br/2013/05/12/titulos-antigos-no-site-do-tesouro-direto/….

3. IstoÉ Cláudio Pablo Pinheiro Câmara

4. Perguntou ao TSE

5. o TSE respondeu

6. http://www.ebc.com.br/infantil/para-pais/galeria/audios/2014/06/cerca-de-20-das-certidoes-no-brasil-trazem-apenas-o-nome

7. Portal Direitos das Crianças e dos Adolescentes da Bahia

8. IBGE 1 Resp Ped Inf 14 05 2015 AMARBRASIL

9. IBGE

a) IBGE 2 Resp Ped Inf 03 e 10 07 2015 AMARBRASIL
b) IBGE 3 Anexo da AMARBRASIL reitera ped de inform 03 07 2015
c) IBGE 4 Resps Recurso AMARBRASIL 27 07 2015

10. http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/brasil-tem-5-5-milhoes-de-criancas-sem-pai-no-registro

11. imprensa@amarbrasil.org.br